Você pode estar em uma seita sem saber

Você pode estar em uma seita sem saber

9 de agosto de 2022 0 Por Sólon Pereira

Atenção! Você pode estar em uma seita pensando que está em uma Igreja Cristã!

Para que você possa verificar se está filiado, engajado, membrado ou apenas frequentando uma seita, pensando ser uma igreja cristã, para um pouco para meditar neste texto.

Nada é novo, mas a falta de conhecimento leva pessoas a caírem em velhos golpes. Por isso, podemos aprender com quem já passou por experiências traumáticas, a fim de evitarmos sermos a próxima vítima.

Vejamos, por exemplo, o que nos ensina Randall Watters, ex-Testemunha de Jeová e ex-ancião de Betel, da Torre de Vigia.

Randall Watters esteve ligado às Testemunhas de Jeová por vários anos. Viveu na sede deles em Brooklyn, Nova Iorque, de 1974 a 1980, sendo encarregado das operações de impressão no departamento da Bíblia e também ajudou a implementar novas tecnologias de impressão.

Embora tenha sido um membro que sempre respeitou sua liderança (Corpo Governante), Randall começou a ser perseguido quando se espalhou um rumou de que estava estudando demais, indo além do que era ensinado pela Torre de Vigia, levantando pontos contrários aos ensinos da Torre de Vigia. Isso porque ele estava fazendo uma pesquisa sobre as religiões.

Para bloquear sua influência, a liderança começou a controlar mais a informação, não permitindo nenhuma discussão, pública ou privada, que questionasse as doutrinas oficiais deles ou a sua autoridade, fazendo referência ao “escravo fiel e discreto” mencionado em Mateus 24:45.

“Quem é, pois, o servo fiel e sensato, a quem seu senhor encarrega dos de sua casa para lhes dar alimento no tempo devido? Feliz o servo a quem seu senhor encontrar fazendo assim quando voltar. (Mateus 24:45,46)

Randall desejava prosseguir seus estudos sobre a religião, mas como não podia tratar sobre o assunto onde estava, no início de 1981, para grande surpresa das Testemunhas de Jeová, após ter concluir sua pesquisa inicial, apresentou sua carta de desligamento, informando as razões de sua decisão.

Imediatamente se espalhou em Betel o rumor de que ele era um “apóstata,” e começaram as investigações para saber quem mais estaria acompanhando o pensamento de Randall Watters.

A pesquisa de Randall Watters o levou à conclusão de que o Cristianismo ortodoxo representava melhor a obra da Igreja Cristã em termos de doutrina e prática.

Após seu desligamento da Torre de Vigia, Randall serviu como pastor de uma comunidade cristã durante cerca de oito anos e, depois, por três anos foi pastor de sua própria congregação.

Na década de 90, Randall desistiu do pastoreio e passou a focar a sua atenção em educar o público a respeito dos cultos e das religiões autoritárias. Seus estudos eram disponibilizados na internet, com ênfase na escravidão aos cultos ou às seitas por meio de mecanismos emocionais e psicológicos, apresentando crítica às técnicas relacionadas ao controle da mente, à coerção, à persuasão e etc.

Neste levantamento, apresentamos dois trabalhos conhecidos de Randall.

O primeiro é “Como identificar seitas perigosas” e será transcrito a seguir.

O segundo é um resumo de ideias que Randall extraiu do livro de Robert J. Lifton, escrito em 1961, sob o título “A Reforma do Pensamento e a Psicologia do Totalitarismo”.

O livro de Lifton não foi escrito com base no que acontecia na religião, mas a partir de uma pesquisa sobre fatos que envolveram os prisioneiros de guerra americanos na China comunista.

Em seu livro, Lifton enumerou oito aspectos principais que podem ser usados para determinar se um certo grupo é uma seita destrutiva e, a partir daí Randall escreveu um texto com o título “Como as seitas controlam a mente dos adeptos”, que será também será transcrito na sequência.

COMO IDENTIFICAR SEITAS PERIGOSAS

RECRUTAMENTO

  1. Engano: a identidade e os verdadeiros objetivos do grupo não são revelados antecipadamente. Os líderes dizem aos membros que eles não podem dar informações sobre o grupo, para que as pessoas “de fora” não saibam muito a respeito deles.
  2. Chantagem emocional: as seitas oferecem amizade e aceitação instantâneas. Os que recrutam novos adeptos não aceitam uma resposta negativa sem que antes levem a pessoa a sentir se culpada ou ingrata pela rejeição de sua pregação.
  3. Exploração de crises emocionais: são exploradas situações como um relacionamento quebrado, um falecimento na família, a perda do emprego, uma mudança recente, a solidão e a depressão.
  4. Invenção de crise: o mundo à nossa volta e os crentes de outras religiões são vistos numa perspectiva sombria, ou o fim do mundo é iminente etc. Dizem para as pessoas que elas devem fazer parte do grupo para que possam ser salvas ou curadas.
  5. Respostas: o grupo tem respostas simplistas e únicas para todas os questionamentos sobre a vida.

PROGRAMAÇÃO

  1. Estudo intenso: a ênfase é posta nos escritos e doutrinas do grupo. A Bíblia, se usada, é citada de forma seletiva e fora do contexto.
  2. Avisos: os novos membros são avisados de que Satanás fará que seus familiares e amigos falem mal do grupo. Dentro de pouco tempo, os recrutas só confiam nos membros do grupo.
  3. Culpa e medo: os grupos enfatizam a natureza pecaminosa do indivíduo e a necessidade de purificar a velha personalidade.
  4. Controle da rotina, fadiga: o estudo e o trabalho para o grupo são obrigatórios, roubando quase todo o tempo do novo membro, tornando-o demasiado ocupado para refletir ou ouvir a opinião de outros. A família, os amigos, o emprego e os passatempos são postos de lado, isolando-o ainda mais.
  5. Ataque a qualquer tipo de pensamento independente: o pensamento crítico é desencorajado e interpretado como orgulho e pecado. É encorajada a aceitação cega.
  6. Comissão divina: o líder geralmente alega ter recebido novas revelações de Deus e afirma ser o único porta voz de Deus para a humanidade neste tempo.
  7. Obediência irrestrita: todas as questões têm respostas simples e requer-se do novo adepto uma obediência inquestionável às ordens do grupo. Uma mentalidade do tipo “nós contra eles” fortalece a identidade do movimento. Todas as pessoas que não pertencem ao grupo são encaradas como fracas ou enganadas.

RETENÇÃO

  1. Questionamento de motivos: quando é apresentada evidência sólida contra o grupo, os membros são ensinados a questionar os motivos da pessoa que apresenta a evidência. Aquilo que pode ser verificado é ignorado e se aceita aquilo que não pode ser verificado.
  2. Controle de informação: o grupo controla aquilo que o membro pode ver ou ouvir. É proibido o contato com ex-membros e com qualquer pessoa que critique o grupo.
  3. Isolamento e alienação: o grupo substitui a família porque ouve que não precisa de mais ninguém (nem mesmo da família) além do grupo. Talvez o novo adepto receba instruções como: proibição de alimentos, proibição de casamento ou abandono do lar, desistência da escola, entre outras.
  4. Repressão: a desobediência, incluindo até mesmo desacordos insignificantes com a doutrina do grupo, terá como resultado o banimento e a expulsão.
  5. Fobias: o medo do mundo e das outras pessoas é aumentado, tal como o medo do diabo e do mal. É ensinado aos membros que lhes acontecerá algo muito mau se deixarem o grupo. Não existe nenhuma maneira honrosa de sair do grupo.
  6. Empenho: ser membro e trabalhar para o grupo é essencial para a salvação. Por mais que o adepto se esforce, nunca será o suficiente.

RESULTADOS

  1. Dependência: o adepto fica com uma dependência infantil do grupo.
  2. Desordens pessoais: depressão, desorientação, ansiedade, estresse, comportamento neurótico ou psicótico, e até mesmo tendências suicidas.
  3. Capacidade diminuída: o adepto perde a capacidade de pensar de forma clara e crítica. Contradições lógicas nas doutrinas têm pouco ou nenhum efeito sobre ele.
  4. Exploração: o adepto é explorado financeiramente, psiquicamente e/ou mentalmente. Pode ser manipulado para dar tudo o que possui ao grupo, abandonar escola ou emprego (para poder passar muitas horas vendendo literatura ou outros itens), fornecer mão de obra barata para o grupo e outras coisas.

COMO AS SEITAS CONTROLAM A MENTE DOS ADEPTOS

1 – CONTROLE DO MEIO

As seitas usam várias técnicas para controlar o meio das pessoas que recrutam, mas usam quase sempre uma forma de isolamento. Os adeptos podem ser fisicamente separados da sociedade ou pode-se-lhes ordenar, sob pena de punição, que se mantenham afastados dos meios de comunicação social, especialmente se estes os levarem a pensar criticamente. Todos os livros, filmes ou testemunhos de ex-membros do grupo (ou de qualquer outra pessoa que critique o grupo) têm de ser evitados.

A organização ‘mãe’ arquiva cuidadosamente informações acerca de cada recruta. Todos são vigiados, para que não se afastem nem se adiantem em relação às posições da organização. Isto permite que a organização pareça onisciente aos adeptos, pois sabe tudo sobre todos.

2 – MANIPULAÇÃO MÍSTICA

Nas seitas religiosas, Deus está sempre presente nas atividades da organização. Se uma pessoa sai da seita, quaisquer acidentes ou outros infortúnios que lhes aconteçam são interpretados como uma punição de Deus. A seita diz que os anjos estão sempre a velar pelos fiéis e circulam histórias em como Deus está realmente a fazer coisas maravilhosas entre eles, porque eles são a verdade. Desta forma, a organização reveste-se de uma certa mística que atrai o novo adepto.

3 – EXIGÊNCIA DA PUREZA

O mundo é descrito a preto-e-branco, não há necessidade de se fazerem decisões baseadas numa consciência treinada. A conduta da pessoa é modelada de acordo com a ideologia do grupo, conforme esta é ensinada na sua literatura. Pessoas e organizações são descritas como boas ou más, dependendo do seu relacionamento com a seita.

Usam-se sentimentos de culpa e vergonha para controlar indivíduos, mesmo depois de eles saírem da seita. Eles têm grande dificuldade em compreender as complexidades da moral humana, pois polarizam tudo em bem e mal e adotam uma posição simplista. Tudo aquilo que é classificado (pela seita) como mau tem de ser evitado e a pureza só pode ser atingida se o adepto se envolver profundamente na ideologia da seita.

4 – O CULTO DE CONFISSÃO

Pecados sérios (segundo os critérios da organização) têm de ser confessados imediatamente. Os membros da seita que forem apanhados a fazer alguma coisa contrária às regras têm de ser denunciados imediatamente.

Existe muitas vezes uma tendência para ter prazer na degradação de si mesmo através da confissão. Isto acontece quando todos têm de confessar regularmente os seus pecados na presença de outros, criando assim uma certa unidade dentro do grupo. Isto também permite que os líderes exerçam a sua autoridade sobre os mais fracos, usando os pecados deles como um chicote para controlá-los.

5 –  O CONHECIMENTO SAGRADO

A ideologia da seita torna-se na moral definitiva para estruturar a existência humana. A ideologia é demasiada sagrada para se duvidar dela e requer-se que o adepto tenha reverência pelos líderes. A seita alega que a sua ideologia tem uma lógica infalível, fazendo parecer que é a verdade absoluta, sem contradições. Um sistema assim é atrativo e oferece segurança.

6 – LINGUAGEM ELABORADA

Lifton explica que as seitas usam de forma abundante de clichês para acabar com o pensamento, expressões ou palavras que são forjadas para acabar a conversa ou a controvérsia. Todos conhecemos os clichês capitalista e imperialista usados por manifestantes anti-guerra nos anos sessenta. Estes clichês memorizam-se facilmente e têm efeito imediato. Chamam-se a linguagem do não-pensamento, pois terminam a discussão, dispensando quaisquer considerações adicionais.

Entre as Testemunhas de Jeová, por exemplo, expressões como “a verdade”, “a sociedade”, “a organização”, “o novo sistema”, “a nova ordem”, “os apóstatas” e “as pessoas do mundo” contêm em si mesmas um julgamento dos outros, não é necessário pensar mais neles.

7 – DOUTRINA ACIMA DAS PESSOAS

A experiência humana é subordinada à doutrina, independentemente de quão profunda ou contraditória tal experiência seja. A história da seita é alterada para se ajustar à lógica doutrinal. O indivíduo só tem valor na medida em que se conforma aos modelos pré-estabelecidos pela seita. As percepções do senso comum são desconsideradas, se forem hostis à ideologia da seita.

8 – DISPENSADOS DA EXISTÊNCIA

A seita decide quem tem o direito de existir e quem não tem. Eles decidem quem morrerá na batalha final do bem contra o mal. Os líderes é que decidem quais são os livros de história exatos e quais são os tendenciosos. As famílias podem ser destruídas e os estranhos podem ser enganados pois não merecem existir!

Como bem relatou Randall, todas as religiões autoritárias deviam ser submetidas a este teste para determinarmos exatamente quão destrutiva é a influência que elas têm sobre os seus adeptos.

Que cada um julgue por si mesmo.

Fontes:

Biografia resumida de Randall Watters (https://bit.ly/3p4nZQr)

Como as seitas controlam a mente dos adeptos (https://bit.ly/3SD6h4o)

Como identificar seitas perigosas (https://bit.ly/3Qaw963)